'Houve um erro terrível', diz judiciário sobre motoboy inocentado após um ano preso que morreu no dia de ser solto

Briner foi preso em outubro de 2021 pela acusação de tráfico de drogas durante uma batida policial na casa onde alugava um quarto. Todo o tempo em que ficou preso, tentou provar sua inocência. 


 O Tribunal de Justiça Tocantins assumiu que houve falha no processo de Briner de César Bitencourt, jovem motoboy de 22 anos que morreu no dia em que sairia da cadeia. Ele passou um ano preso preventivamente tentando provar sua inocência em um caso de tráfico de drogas e foi absolvido.

No entanto, por atraso do judiciário, o alvará de soltura chegou depois que ele teve complicações por uma infecção que adquiriu na cadeia e já havia morrido. A família só foi avisada do quadro de saúde dele após a morte.

"Houve falha. [...] Houve um erro terrível e isso é incompatível com a mais elementar ideia de justiça. A expectativa é que o estado tocantinense, como um todo, assuma isso perante a família", disse o juiz auxiliar do Tribunal de Justiça do Tocantins, Océlio Nobre da Silva.

Briner foi preso em outubro de 2021 pela acusação de tráfico de drogas durante uma batida policial na casa onde alugava um quarto. Todo o tempo em que ficou preso, tentou provar sua inocência. Antes de ir para a prisão injustamente, ele trabalhava como entregador por aplicativo e fazia vídeos engraçados nas redes sociais sobre rua rotina como como motoboy.

Além de Briner, outras duas pessoas foram presas. Vídeos dos depoimentos na delegacia mostram o motoboy negando envolvimento com o tráfico de drogas, enquanto outro preso assume a culpa. "Nós divide em três o aluguel, né? Eu morava na frente. Só entrava na casa para usar o banheiro, fazer uma comida. Mas eu não sabia nem da droga nem de nada não", disse Briner.

Briner não tinha antecedentes criminais. A gerente da lanchonete onde Briner trabalhava diz que ele era um bom funcionário. "Todas as noites ele estava aqui trabalhando. Chegava no horário certo, saía no horário certo", disse Marina Lourrayne.

O jovem ficou preso temporariamente por quase um ano. Na Unidade Prisional de Palmas (UPP) pelo menos 15 dias antes de morrer ele passou a sentir dores pelo corpo e segundo a Secretaria de Estado da Cidadania e Justiça (Seciju), responsável pelos presídios e detentos do Tocantins, o quadro de saúde piorou na noite de domingo (9) para segunda-feira (10). Ele foi levado para uma UPA da capital, mas não resistiu.

O IML de Palmas ainda não concluiu o laudo final sobre a morte de Briner, mas o diretor contou ao Fantástico qual foi a causa da morte dele. “Foi uma embolia séptica. Ele teve uma infecção generalizada que evoluiu com a embolia séptica. O coração dele não conseguiu fazer o bombeamento adequado para os órgãos dele, e ele acabou vindo a óbito”, destaca Eduardo Godinho, médico legista e diretor-geral do IML.

O que o IML ainda não sabe é o que causou essa infecção generalizada, resposta que depende de outros exames.

A família do motoboy disse que nunca recebeu informações sobre o estado de saúde do jovem e acredita que houve omissão de socorro. "Mataram o meu filho lá dentro. O sistema penitenciário matou o meu filho", lamentou a mãe Élida Pereira.

"Cabia aos responsáveis cuidar da saúde dele. Cuidar da integridade física dele. Não é entregrar um corpo para a família", disse a advogada Lívia Machado.

Recentemente a Defensoria Pública do Tocantins moveu um requerimento indicando que 200 presos estavam pedindo algum tipo de atendimento médico e não estavam conseguindo. Com base em diversas denúncias de irregularidades e violações dos Direitos Humanos, um grupo de 10 defensores públicos pediu o afastamento do diretor da unidade prisional.

A sentença que determinou a inocência do jovem saiu na sexta-feira (7), mas ele ainda estava na UPP porque ainda não tinha um alvará de soltura. O documento só saiu na segunda-feira, mas Briner já estava morto.

Em entrevista ao Fantástico, o juiz disse que houve atraso na expedição do alvará de soltura. É que após absolvição, o preso deve ser liberado em até 24 horas, como manda a Lei. Océlio Nobre da Silva diz que a situação está sendo investigada. "O atraso na expedição do alvará de soltura é objeto de investigação de uma sindicância que o Poder Judiciário determinou que fosse instaurada", disse o juiz

Sobre a falta de comunicação com a família, a Secretaria de Estado da Cidadania e Justiça disse que havia seguido protocolo e que "devido ao sigilo médico/paciente, os atendimentos realizados durante à custódia não são informados". A advogada de Briner, Lívia Machado Vianna, disse que não houve transparência e que nem a mãe do jovem, Élida Pereira da Cruz Dutra, soube que o filho estava doente.

Após a repercussão do caso, a secretaria disse que uma sindicância foi aberta para "apurar minuciosamente os fatos" e que "criará uma comissão multidisciplinar para reavaliar os protocolos de comunicação à família".

A mãe relata que passou um ano apoiando o jovem na luta por inocência. Na última segunda-feira (10) os parentes preparavam para recebê-lo em casa e foram informados sobre a morte.

O corpo de Briner foi enterrado na quarta-feira (12). Familiares e amigos fizeram um protesto para cobrar respostas sobre a morte, já que ele ficou doente dentro do presídio.

O que diz o Tribunal de Justiça do Tocantins

O Tribunal de Justiça do Tocantins (TJTO) informa que já abriu procedimento acerca dos fatos envolvendo o processo sobre o caso Briner de César Bitencourt, para apurar eventuais falhas durante o trâmite processual.

Ao lamentar o ocorrido e se solidarizar com os familiares da vítima, o TJTO ressalta que a apuração será rigorosa e que, em virtude disso, não pode se antecipar na definição de um culpado pelo ocorrido, mas que não haverá omissão na apuração da conduta de todas as pessoas que trabalharam no referido processo, seja no âmbito do Judiciário ou de algum outro órgão responsável pela custódia dos presos.

O TJTO ressalta que já trabalha na reestruturação das competências da 4ª Vara Criminal de Palmas em razão do aumento das demandas e reduzida força de trabalho na unidade. Este trabalho de promover a eficiência em todas as unidades do Poder Judiciário é incessante e, no momento, está concentrado na reestruturação daquela Vara, que cuida dos processos de execução penal na Comarca de Palmas.

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